domingo, 30 de abril de 2017

Ciano-verde {A minha avó}

Quando morreste fechei-te as mãos em redor de um pedra turquesa. Confiei entre as tuas palmas transparentes uma pedrinha redonda, azul firmamento, polida com o mesmo cuidado com que protegias-me as mãos pequenas ao caminharmos pela rua. 
Nesse dia, para ti por fim sereno, guardei a pedrinha no casulo dos teus dedos paralisados que dormiam sobre um peito demasiado anónimo. Aquele que tinha sido o teu peito, mas onde já faltavas.

Nunca cheguei a contar-te. As turquesas que usavas ao pescoço eram pontos luzentes de magia num mundo violento demais a ambas. Demasiado ríspido e alheado à nossa subtileza. 
Nós éramos duas meninas, avó. Duas meninas de idades distintas que fantasiavam em contos sobre o mar, coleccionávamos búzios pelos reflexos que faziam à luz e segredávamos às nuvens. Nesse teu colar eu via ainda, junto à respiração do teu pescoço, o Sol e um par de estrelas douradas em órbita.

As pedras de Hator e Ísis, deusas cujo colo são o trono real do céu que é afinal o ventre imenso de uma deusa mãe maior, são também amuleto de Yemoja, rainha africana dos oceanos. 
E é aqui avó, por estes quatro cantos do Universo, no infinito azul levemente esverdeado das tuas pedras mágicas, que sei que cuidas ainda das minhas mãos. Sei que as resguardas tão bem como fazias, num aflito aperto, ao atravessarmos o Rossio. 
Estas mãos, avó, que são hoje ainda tão pequeninas.

2 comentários:

  1. Querida Cristina fizeste-me chorar... Lembrei-me da minha avó, tão importante para mim, que no dia em que finalmente tomar coragem e fizer uma tatuagem, a letra do nome dela estará lá incluída para ficar para sempre na minha pele.
    Beijo grande para ti e para o Mimão

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    1. era das poucas tatuagens que faria também Beli , mas ela está tão presente que nem sinto valer a pena! beijão para todos voces

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