segunda-feira, 9 de abril de 2018

Em par

O seu mau diabo convenceu-o de que não sabe dançar a dois.
Ele gosta de dar-lhe ouvidos.



Mas ao abraçá-la, naquela urgência tão corpórea de gestos sólidos e quentes, quase febris, embala-a ternamente.

"Depois do colo da minha mãe jamais alguém embalou-me na vida." 

Ele balouça-a junto a seu peito, ritmando-a de um lado para o outro e, gentilmente, do outro para o outro num movimento contínuo e compassado. Num movimento de aninho e atenção.

"Acho que crês em demasia no teu mau diabo. Estamos a dançar, os dois."

Falhou ao seu mau diabo a lembrança de que até os beijos são uma dança acertada a dois e que, por entre o cheiro doce das suas respirações, nesses reflexos instintivos e demorados, ele sabe afinal dançar primorosamente em par.

"Só por hoje não permitirei sentir medo em perder esta harmonia e assumo que esta é a melhor melodia que temos juntos para dançar."